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Anielle Guedes

Turismo espacial: férias inesquecíveis na Lua

Anielle Guedes

06/06/2019 04h00

Um período de férias na Lua, até há alguns anos, era um conceito possível somente em filmes e séries de ficção científica. Agora, a viagem ao espaço é uma possibilidade muito mais próxima da realidade e pode estar ao alcance de mais pessoas, não somente dos astronautas profissionais.

O fluxo de viagens ao espaço deve aumentar nos próximos anos e diferentemente do que ocorreu entre os Estados Unidos e União Soviética, a Corrida Espacial do século 21 é liderada pela iniciativa privada. Gigantes como SpaceX e Boeing competem para ver quem chega mais longe – e primeiro. Quem serão os empreendedores mais bem-sucedidos na exploração do espaço?

Há 50 anos o homem pisava na Lua. Em 2019 ainda aguardamos pelos próximos passos

Próximo da véspera do aniversário de 50 anos da chegada da Apollo II na Lua e dos famosos passos de Buzz Aldrin e Neil Armstrong que fizeram história, a SpaceX, de Elon Musk, pode levar os Estados Unidos de volta à Lua. A NASA anunciou no final de maio que selecionou três módulos de pouso lunar para enviar material científico para a Lua em 2020 e 2021.

Os módulos serão lançados pela SpaceX e com a chegada dos equipamentos à Lua, a NASA prevê que dentro de cinco anos poderão enviar a primeira mulher e mais alguns homens ao satélite natural. Com a missão, a Agência Espacial Americana busca facilitar as próximas viagens para a Lua e Marte. A verdade é que mesmo 50 anos depois do homem pisar na Lua pela primeira vez, as viagens espaciais ainda são extremamente caras e tecnicamente complexas.

Ao longo dos últimos 20 anos, muitas empresas surgiram com a promessa de oferecer viagens à Lua e a possibilidade de viver em Marte, porém nenhuma delas conseguiu, de fato, tornar esse sonho humano em realidade. Até o momento, sete pessoas pagaram para ir para o espaço, como Dennis Tito, que foi o primeiro turista espacial em 2001, viajando para a Estação Espacial Internacional (ISS) por uma bagatela de 20 milhões de dólares. Depois disso, mais seis turistas espaciais voaram, mas o fluxo terminou em 2009.

Porém, todas essas viagens que ocorreram até o momento foram feitas em órbita baixa, a 2000 km da superfície da Terra. Ou seja, nenhum turista espacial chegou perto da Lua. Esses viajantes passaram dez dias ou mais na Estação Espacial Internacional (ISS), que é o único posto avançado permanentemente tripulado da humanidade, trabalhando ao lado de astronautas profissionais. Em 2025, após mais de duas décadas em funcionamento, a ISS será aposentada e a frequência de voos deve aumentar até lá.

Que tal passar as próximas férias no espaço?

Se tudo der certo, 2019 pode ser o ano em que, finalmente, as empresas privadas passarão a levar seres humanos para o espaço e isso seria um passo vital para tornar a experiência mais acessível. A Virgin Galactic é uma delas. Após realizar sua primeira viagem ao espaço no ano passado, agora a empresa pretende realizar mais voos de teste com a possibilidade de levar seus primeiros passageiros. Mais de 700 pessoas compraram ingressos com a empresa a um custo de 200 mil e 250 mil dólares. Cada voo contará com seis passageiros, que passarão por vários minutos de ausência de peso e terão incríveis vista da Terra enquanto o veículo espacial pula no espaço.

Outra empresa que espera chegar ao espaço neste ano é a Blue Origin, do CEO da Amazon, Jeff Bezos, que começará a vender seus ingressos nos próximos meses. Os preços devem seguir a média da Virgin. O número de passageiros por viagem também. Os passageiros poderão flutuar ao redor da cápsula do foguete por vários minutos, antes de retornar à Terra com um pára-quedas.

Hospedagem na Lua 

Se o transporte para o espaço não será mais um problema, como fica a hospedagem? O centro de astronautas da Agência Espacial Europeia, na Alemanha, pesquisa conceitos relacionados ao ambiente lunar Lua. Com o desafio Moon Village Association, a ESA busca desenvolver um conceito que funcione com a tecnologia existente e o conhecimento da Lua para construir habitações. O principal objetivo dos edifícios lunares será proteger os habitantes de condições externas que poderiam causar danos e criar um habitat que sustente a vida humana.

No entanto, existem outras condições importantes a serem consideradas no planejamento, como a luz solar, as mudanças de temperatura, o tipo de terreno e o nível de gravidade. Devido à falta de uma atmosfera protetora ou campo magnético, qualquer base lunar também deve proteger seus habitantes da radiação e minúsculos meteoritos que chovem no céu. Tudo levando em conta as possibilidades de um futuro na Lua.

Enquanto isso, a Orion Span está planejando a Estação Aurora, o primeiro hotel espacial de luxo do mundo, que começará a ser construída em 2021. A estação terá duas suítes privadas, com um total de quatro convidados e dois tripulantes por estadia. Os visitantes terão que passar por um treinamento de três meses para visitar a estação, sendo que originalmente o tempo de preparação era de 24 meses. Para passar 12 dias no espaço, o viajante terá que desembolsar 9,5 milhões de dólares, pelo menos metade do valor que os viajantes espaciais pagaram até então. Até o momento a startup não conseguiu levantar fundos suficientes para a construção do primeiro módulo.

A Roscosmos, a Agência Espacial Russa, tem um plano similar de construir um hotel de luxo no espaço. Os hóspedes do hotel terão quartos privados, instalações de higiene e médicas, bem como um lounge. Os preços variam de 40 milhões de dólares para estadias de uma a duas semanas a 60 milhões de dólares para uma estadia de um mês que incluiria uma caminhada espacial guiada por um cosmonauta.

De Shanghai a Nova York em 39 minutos – espacial sim, mas dentro da órbita

Nem todos os serviços espaciais estão focados em viagens para fora da órbita da Terra. Uma das grandes vantagens de voos espaciais da Terra para a Terra é reduzir o tempo de viagem, levando o passageiro de um ponto a outro no planeta em menos de uma hora. Essa seria uma revolução para o transporte aéreo possibilitado pela tecnologia de foguete reutilizável BRF da SpaceX. Essa tecnologia permitiria uma viagem de Nova York a Dubai em 39 minutos e de Bangkok para Dubai em 24 minutos. Tempo menor que a média da maior parte das viagens de metrô que muitos passageiros enfrentam diariamente para ir ao trabalho.

O foguete ainda está em estágio inicial de desenvolvimento, mas Elon Musk afirmou que o protótipo deve ser testado em 2019. Com esse prazo otimista, um voo orbital ao redor da Terra deveria ocorrer em 2020. Ainda não adianta se animar muito: para sair dos testes orbitais e chegar a voos comerciais Terra-a-Terra, devemos aguardar, pelo menos, algumas décadas. A SpaceX está realizando testes com os foguetes BRF e teve muitos avanços, porém ainda está longe de levar a tecnologia a estágio comercial.

A tecnologia de reuso de foguetes da SpaceX é um dos motivos pelos quais essas viagens seriam possíveis e também uma das razões para que o valor das viagens espaciais diminua. Segundo a SpaceX, as modificações feitas pela empresa em um de seus foguetes permitem que cada BRF 5 voe 10 vezes, ou mais, antes de precisar de reformas leves e até 100 vezes antes aposentadoria.

Caso você não tenha percebido pelos valores citados acima, viajar para o espaço não será nada barato. Dependendo do trajeto, um ingresso pode custar de 250 mil até dez milhões de dólares, preço já muito menor do que os valores pagos pelos primeiros turistas espaciais. Também muito menor do que o dinheiro gasto para colocar pessoas e cargas no espaço, que é de dez mil dólares por quilo.

A corrida espacial agora tem mais competidores

A gradual diminuição de valores  das viagens espaciais se deve ao crescimento de empresas privadas no setor e suas novas tecnologias. Sendo que as duas mais visadas para viagens espaciais e que já começaram a lançar astronautas em órbita são a SpaceX e a Boeing, que foram contratadas pela NASA para levar os tripulantes até a ISS. Por enquanto, as duas atuam apenas com missões contratadas, mas as empresas planejam pilotar seus próprios astronautas em uma tentativa de tornar o espaço mais acessível e abrir as possibilidades de voos turísticos. A SpaceX tem planos de levar viagens pagas à Lua em 2023 com um bilionário japonês e um grupo de artistas selecionados que deverão ser os primeiros viajantes privados além da órbita baixa da Terra.

A Índia também faz parte dos países que querem chegar até a Lua. A Organização Indiana de Pesquisa Espacial está se preparando para sua próxima missão lunar, com o Chandrayaan-2, com previsão de lançamento neste ano. O Chandrayaan-2 consistirá de um orbital lunar, que mapeará a lua a partir de uma altitude de 100 quilômetros e um módulo de aterrissagem, que deverá pousar próximo ao pólo sul lunar e posicionar um pequeno veículo espacial. Se a missão for bem-sucedida, a Índia se tornará um dos primeiros países a conquistar um pouso suave na Lua. O país também pretende se tornar uma das poucas nações a enviar seres humanos ao espaço usando seus próprios foguetes e espera seu primeiro voo tripulado para 2022.

A agência espacial do Estado da Rússia anunciou planos de enviar turistas ao espaço nos próximos dois anos. A rota deve ser a mesma do cosmonauta soviético Yury Gagarin, que fez história como o primeiro humano a orbitar a Terra quando passou 108 minutos no espaço em 1961. A Roscosmos assinou um acordo com a Space Adventures, empresa de turismo espacial dos EUA, para enviar dois civis para a Estação Espacial Internacional (ISS) até o final de 2021.
A partir de 2019 as viagens espaciais se tornarão mais frequentes, tanto dentro da órbita terrestre em direção a Estação Espacial Internacional, tanto com objetivo de chegar na Lua. O turismo espacial passa a ser mais realidade do que ficção. Será que já dá para planejar férias no nosso satélite mais próximo? Parece que para a próxima geração essa ideia irá além de um sonho.

 

 

Sobre a autora

Anielle Guedes estudou Física e Economia na Universidade de São Paulo e sem concluir os cursos de graduação embarcou em uma pós graduação nos Estados Unidos sobre inovação disruptiva na Singularity University (localizada em uma base da NASA). Assim virou especialista em tecnologias emergentes, foresight e desafios globais. Fundou uma startup de impressão 3D e manufatura avançada para construção, a qual liderou por 4 anos e atuou no Brasil, Estados Unidos e Europa. Foi eleita pela Forbes, MIT e Bloomberg como uma das jovens mais inovadoras do mundo. Tornou-se consultora em inovação e desenvolvimento econômico, participando de projetos de advisory e advocacy em governos federais e organismos multilaterais, além de ser conselheira de organizações como o Conselho Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável. Palestrou em mais de 30 países. Atualmente cursa Economia e Ciência Política pela Universty of London, London School of Economics.